E quando o corpo pede para parar?

Publicado em 15 de outubro de 2013

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Hora de voltar à prova. Dei de cara com mais subidas insanas e descidas destruidoras de pernas. Perto da região de Lagite, Km 74, o meu estômago começou a tentar me derrubar e para ajudar eu tinha que enfrentar mais uma ‘belíssima’ subida. As minhas forças praticamente sumiram e por muitas vezes fui ultrapassado (esse não é um fato relevante numa prova desta distância), e o fato de não conseguir acompanhar o ritmo dos demais nas subidas começou a me preocupar.
Estava sofrendo demais e confesso que cheguei ao ponto de pensar em desistir. Repetia mentalmente “você precisa pensar em uma solução rapidamente”. Busquei energia num pedaço de pão, chocolate, um mix de frutas secas com amêndoas e coca-cola (cuidadosamente guardada desde a última parada, justamente para me ajudar caso a dor no estômago seguisse). Chega um momento depois de muitas horas de prova, em que a gente não aguenta mais ingerir gel de carboidrato e, para piorar, um dos itens que mais funcionaram comigo durante os treinos, que era a ingestão de pure de batata, não tinha saído nada bom no hotel.

O que me restava? Comecei a rezar. Primeiro baixinho. Começou a esfriar e coloquei a jaqueta corta vento, começou a chover. Era hora de começar a rezar em voz alta. Eu e muitos outros corredores (rs). Estava claro pra mim que não era vergonha pedir aos céus uma ajuda. E rezei. Rezei com todas as minhas forças.

O tempo foi passando e para “ajudar”, a bateria da minha primeira lanterna começou a dar sinais de que iria acabar. Parei, abri a mochila, peguei a lanterna reserva e a mesma caiu no chão. Coloquei na cabeça, guardei a outra e comecei a correr. Em 5 min. de corrida, a nova lanterna se apagou (era só o que me faltava naquele momento). Ligava novamente, mas ela só ficava acesa por alguns momentos e depois se apagava. Parei novamente, guardei a lanterna reserva peguei a lanterna anterior e coloquei no modo economico. Já avisei minha equipe de apoio que precisaria de uma bateria reserva para chegar até o final da prova. Esse processo de tirar a mochila das costas, abrir, fechar e colocar nas costas parece simples mas não é, é demorada e suficiente para esfriar o seu ritmo.
Nas descidas eu me sentia um pedaço de carne passando pelo moedor. Nas subidas, os passos estavam demasiadamente lentos, me comparava a um carro subindo a ladeira com o freio de mão puxado. Mas eu não deixava de pensar: vamos adiante, um passo na frente do outro, que esse mal estar vai passar. Por algumas vezes parava para respirar e em uma dessas paradas, enviei uma mensagem para a minha esposa, com um texto curto e direto: “Não vai dar, está dificil. Rezem por mim”. E dela eu só recebia palavras de incentivo: “Vai dar sim. Você é guerreiro. Não desista. Estamos aqui torcedo por você”.
Naquele momento, uma série de imagens e pensamentos vinha a minha mente: a imagem do meu falecido pai, da minha esposa, dos amigos e principalmente da minha filha Valentina, que me disse quando viajei para França “papai, você vai trazer a medalha pra mim?”. Eu disse: “papai não voltará sem essa medalha”. E também não dava para esquecer o conselho do meu amigo Thiago Mini Cooper: “Velho, você termina essa prova nem que seja engatinhando, rastejando, mas vai terminar”.

Antes de se tornar a minha futura corredora, eu ainda devia uma medalha do UTMB para Valentina.
Valentina, uma das minhas inspirações (e minha futura corredora).

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