O ponto de partida
Tudo começou em 2009, no Cruce de Los Andes. Foi ali, em meio as cordilheiras chilenas, que descobri um novo mundo e uma nova paixão: as Corridas de Montanha. Nem bem tinha terminado aqueles 100k e meu coração já palpitava com uma nova descoberta, a meca das Ultramaratonas em Chamonix.
Cruce de Los Andes – 2009
Debutei no Ultra Trail du Mont Blanc em 2010, fiz 87k dos 100k do CCC. Naquele ano os deuses da montanha não permitiram que eu fosse até Chamonix, a chuva não deu trégua e a prova foi paralisada. Mesmo assim, fui considerado finisher e aceitei o título, pois sabia que me sobravam pernas e vontade. Fiquei tão encantado com a prova e ao mesmo tempo frustrado por não ter cruzado o pórtico de chegada, que eu resolvi voltar em 2013. Desta vez para fazer os 120k do TDS. Que prova! Sofri e chorei tanto que nem sei. Foi na raça e na fé que terminei aquele desafio e finalmente pude vivenciar aquela apoteose que é chegar em Chamonix e ser aplaudido por centenas de pessoas, que sensação!
Um ano depois fiz o OCC, que corresponde os 53k, parte de Osieres passando por Champex e terminando Chamonix. E agora meus amigos, só me faltava ela, a épica e a mais importante prova do circuito, a UTMB, os 171km que correspondem a volta completa pela imponente Mont Blanc, passando por montanhas que à circulam nas fronteiras com França, Itália e Suíça. Com mais de 10.000m de desnível positivo, essa prova com certeza desafiaria todo o meu conhecimento em provas de montanha.
O caminho para chegar a UTMB não é nada fácil! Em um intervalo de 2 anos, é preciso ter 15 pontos conquistados em 3 diferentes provas de no mínimo 100k, todas elas acreditadas pelo UTMB. Além disso, devido ao grande número de atletas inscritos em todo mundo e a capacidade limite de recepção da Cidade de Chamonix, após conquistar os pontos, os inscritos ainda participam de um sorteio para conquistar espaço nesta prova.
Como um bom conhecedor do caminho, me aventurei. Cruzei pórticos na Mongólia Sunrise to Sunset (Mongólia) , Pirineus (França), Tilcara (Argentina), Ultra Fiord (Chile), La Mission (Brasil) e, enfim, me credenciei para fazer a inscrição. Agora, precisava ser sorteado e sobre isso eu não tinha controle. Sou um homem de profunda fé, sei que o que é para ser meu, a vida providencia. Então foquei naquilo que tinha controle, minha preparação.
O caminho
Foi duro! Horas e horas de musculação, de montanha e sacrifício junto com a família. Como esquecer das inúmeras vezes em que fui para o Japi, em Jundiaí. Fazia sol ou chuva, lá estava eu naquele lugar cercado de trilhas, montanhas e estradões. Fiz muitos treinos especiais nos picos Marins-Itagaré e o bate volta Passa Quatro-Marinzinho, todos nas montanhas de Minas Gerais. Em Passa Quatro rodei 100k noturnos (onde até assombração eu vi rs…) num frio que o esqueleto tremia.
Em um determinado momento, um amigo convidou para fazermos um treino fora do que estava especificado na minha planilha eu disse assim: “Busta, meu brother, o UTMB é um sonho que carrego há 10 anos e por isso, no momento em que eu alinhar para a largada na Praça do Triângulo na frente da igreja de San Bernard em Chamonix, quero ter a plena convicção que tudo, absolutamente tudo, foi feito e que eu sou merecedor de ali estar!”
Pode parecer uma certa arrogância, mas essa prova é o sonho de milhares de atletas do mundo inteiro. Nesta ocasião, eu já sabia que tinha sido sorteado, eu fui abençoado com este sorteio e teria que provar que era merecedor.
Teste de tênis, roupa, alimentação. Foram 6 meses ininterruptos acordando às 5 da manhã e levando meu corpo ao limite extremo até ouvir a sentença que acalentou o coração. Meu técnico Marcelo Sinoca disse: “Cição tu está pronto, vai lá e curta a jornada, Opalão”. Só pensei “Ahhh eu vou curtir, é certo que vou!”
A paisagem
Cheguei em Chamonix uma semana antes da largada, preparado psicologicamente e fisicamente. Sabia que teria que trabalhar a minha ansiedade pois o UTMB é a última prova do circuito. A largada era apenas às 18 horas da sexta. Para baixar a ansiedade, realizei alguns trotes durante a semana, sempre acompanhado pela minha amiga Ligia Almeida, que também faria o UTMB.
Meu joelho esquerdo tinha sofrido com os pequenos treinos pré prova, quis voltar “a conversar” rs, mas procurei focar nas coisas boas. Na medida em que os dias iam passando, uma mistura de tensão e expectativa tomava conta de mim pois, todos os meus amigos ou já tinham feito ou fariam suas respectivas provas antes de mim.
Procurei interagir com a turma, mas sem cair muito no “oba, oba” pois, sabia que o desafio a frente era o maior da minha vida. Fazia exercícios de respiração, olhava e ajustava o meu planejamento de prova junto com os meus amigos, Elmo e Mario.
Ficamos todos em uma mesma casa e era impossível não se divertir. Todos os dias nos reuníamos na cozinha onde o Gerson (amigo de longa data) e a Fabi esposa do Elmo, tomavam conta do menu. Sempre regados de boa música e de boa prosa, nos distraímos falando sobre amenidades.
A ficha começou a cair no momento em que fomos buscar o kit e caiu de vez no momento em que coloquei a pulseira com a descrição da prova. Pensei: “É meu amigo, a hora está chegando, engole o choro! É hora de pôr em prática tudo o que você aprendeu nestes 10 anos de corrida de montanha. ”
A largada
O dia D chegou e com ele, revisei todos os detalhes para largada: mochila, hidratação, vestimenta, previsão do tempo. Ligia, eu e nossas equipes fomos caminhando devagar até a largada. Olhei para a igreja e pedi proteção a todos os corredores que ali se amontoavam. Quase instantaneamente, os Deuses da Montanha em um ato de poder absoluto, resolveram mandar um aviso através da chuva, para avisar que ali quem dá as cartas são eles.
Faltando pouco menos de 2 minutos para que aquela música, que esperei 10 anos começasse a tocar, “Conquest of Paradise” de Vangelis. A voz do locutor pedia para que os atletas batessem palmas de maneira ritmada, era uma sinfonia perfeita. O coração apertou e as lágrimas vieram ao meu rosto, que emoção! Me concentrei e cessei as lágrimas, o caminho era longo e eu precisaria de todo equilíbrio e foco para percorre-lo. Ao meu lado, sentindo a mesma emoção, estava Ligia. Nos demos um abraço e a largada foi dada.
Aquela multidão de atletas, perto de 2.400, fez com que a nossa largada fosse bem lenta e continuou assim até saírmos de Chamonix. Ganhamos muitos aplausos e gritos de incentivo da multidão.
Primeiros kms
Passei bem tranquilo por Les Houches no km 9 e não demorou muito para eu dar de cara com a primeira subida. Não tive dúvidas, armei meus bastões junto com centenas de atletas e a sinfonia era única: “pléque, pléque, pléque”. O som dos bastões batendo no solo. Logo na primeira descida me lembrei do porquê as descidas machucam mais do que as subidas…
A chegada em Saint Gervais no km 21 foi bacana. A cidade estava especialmente pronta para receber os atletas. A gritaria era geral e as crianças com as mãozinhas esticadas esperando pelo nosso high five. Ao sair do PC abro meu celular para ver o próximo trecho e escuto: “É por aqui Ciçãooooo”, nada mais nada menos que Manu Vilaseca, uma das melhores atletas brasileiras, que hoje vive na Espanha e no dia anterior tinha mandado 140k em 24 horas fazendo um TDS perfeito. Ganhei o seu abraço e me lembrei do seu mantra “a cada passo dado é um a menos para a chegada”.
Uma confissão! Até o km 30 eu estava meio de bode da prova, mentalizava apenas a chegada em Chamonix, até um momento em que a ficha caiu, sabe? Pensei com os meus botões: “Que porra é esta Cição? Que merda você está fazendo? Você sabe que essa prova tem 171k, não adianta ficar pensando no km 171 sem pensar no km 20, no km 30e assim por diante”. Como num passe de mágica, passei apenas a pensar em como chegar bem no próximo PC, errando o menos possível e deixando guardado o km 171 para depois.
Assim a prova foi evoluindo na mais absoluta paz no caos (literalmente). Cheguei em Les Contamines as 22h33, estava bem. O corte estava previsto para meia noite. Ali encontrei o Mario, líder da minha running crew/equipe de apoio, que além de ser um ultra experiente corredor, conhece muito bem como funcionam as coisas nos PC’s e também já havia me acompanhado nos Pirineus em 2018.
A noite chegara e com ela um receio de como o meu corpo reagiria ao sono, para a minha sorte eu passei muito bem a noite. Tendo apenas um pico de sono no fim da madrugada em Col de Seigne, km 65 da divisa entre França e Itália. Tomei um gel com cafeína que rapidamente deu um chute na minha bunda e fez com que eu despertasse. A minha headlamp foi o ponto alto da noite. Como um farol de caminhão, iluminava tudo e mais um pouco.
Durante a madrugada, o ballet formado pelas headlamps dos atletas era um espetáculo à parte. Olhava pra cima e via aquela faixa de luz serperteaneando a montanha e quando olhava pra trás eu pensava: “Putz, eu subi tudo isso!”
As passagens pelos PC´s eram rápidas. Aprendi com Nazário a refletir sobre o que pretende fazer antes de entrarem cada PC´s, inclusive se pretende descansar um pouco. São decisões fundamentais em uma prova de longa distância. Eu já avistava o PC e observava o tempo em que eu estava do corte, o que precisava reabastecer na minha mochila, o que comeria e beberia e o lixo que precisava descartar. Assim foi por La Balme, La Croix du Bonhomme, Les Chapieux e Col de la Seigne.
O dia começou a raiar em Lac Combal junto com um frio de bater os dentes. Sim, era alta montanha e corríamos ao lado das geleiras por um terreno cheio de pedras, aliás, pedras era o que tinha para qualquer lugar que você olhasse. Talvez por esse motivo é um dos lugares mais lindos da prova. Estava em meio a um vale onde podia ver o PC na parte baixa da montanha, longe da minha zona de conforto: pedras, pedras, descidas e mais descidas. Quando cheguei tomei uma sopa, comi pão, me hidratei e tratei de dar o fora dali o mais rápido possível. Queria chegar em Courmayer no km 80.
A metade da prova
Chegar em Courmayer era o meio da jornada, teria vencido a parte mais temida da prova. Comecei a descer rumo ao km 80, era uma descida insana e com uma inclinação absurda, não posso jamais esquecer de mencionar uma cena que vi com os meus próprios olhos: uma senhora loira (que me fez lembrar uma artista de nome Lorena McKennitt, escuta The Mummers´Dance com os olhos do coração) tocando uma arpa no meio da montanha, algo de arrepiar. Me arrependo de não ter parado para tirar uma foto.
Cheguei em Courmayer uma hora antes do previsto, quando passei pelo corredor das sacolas com o dropbag, reconheci os gritos dos amigos: “Vai Ciçãoooooo”. A emoção bate nessas horas, né? Só deu tempo de soltar um: “Vamos porra!”. Entrei no ginásio, que mais parecia um campo de refugiados: atletas dormindo, tratando ferimentos, comendo ou simplesmente conversando. Tratei de seguir o plano: me troquei, comi, fui ao banheiro, fiz uma rápida massagem com ajuda do Mario e segui rumo ao próximo PC. Tempo investido? Não mais que 40 minutos. Haviam atletas que precisavam ou que estavam parados ali há mais de 2 horas, cada um com a sua estratégia.
O calor infernal
A subida até o Refúgio Bertone foi um desafio. Comecei esse trecho ao lado de um ultramaratonista argentino, mais velho e bem mais forte do que eu. Com um humor peculiar ele me dizia: “Vamos hermano, fuerza” eu respondia: “Gracias hermano, adelante”. Não demorou muito tempo, ele desapareceu montanha a cima.
O calor consumia minhas forças, estava no Refúgio Bonatti chegando perto do km 90 e foi quando os dois principais problemas surgiram no caminho. O primeiro foi que não conseguia mais comer, o gel não estava mais descendo e o que serviam nos PC´s já estava me causando enjoo. Mandei um áudio para a minha equipe pedindo para que levassem um purê de batata até o PC Champex Lac, no km 123. Aquela combinação de calor e a falta de comida fez com que eu encarasse a pior subida da prova na base da raça. O Gran Cool Ferret não perdoava. Eram “só” 2,2 kms com 768 metros de subida e eu havia esquecido de passar vaselina nos pés. Aquele atrito somado ao calor custaram caro, quase levaram minha resiliência e a vontade de continuar na prova.
Naquele momento busquei minhas âncoras, a base onde reencontro minhas forças: conversei com o meu pai, rezei pra caralho, pedi forças a minha mãe, pensei nas minhas filhas. Dentro de mim, eu sabia que visitaria o fundo do poço em algum momento durante a prova e a meta era, que quando isso acontecesse, eu usasse das minhas armas para sair de lá o quanto antes. Nesta subida infernal, cada passo era uma eternidade, outros atletas também subiam lentamente. No meio da subida, me deparei com um “fio” de água de gelo onde alguns atletas paravam para beber, segui o flow dos meus companheiros e tomei alguns goles de água geladinha, conforme ela ia descendo, sentia meu corpo esfriar e me agarrei naquela sensação agradável. Um pequeno presente que me ajudou a seguir.
Por vezes, fazia um exercício de respiração que aprendi com a Leka, massagista que tem na sua formação a prática da Yoga. Quando sentia que o coração bombava, tratava de respirar fundo, soltando o ar pela boca uma cinco vezes seguida.
Quando finalmente alcancei o cume e avistei a cruz do Gran Cool Ferret dei um grito: “Ahhhh filho da puta! Você não me derrubou, agora a parada é comigo! ”. Esquecer a vaselina estava custando um preço alto, não conseguia descer no flow em que estava acostumado. Então, até que eu consertasse as coisas, resolvi descer de maneira bem conservadora. Encontrei alguns atletas portugueses, trocamos algumas ideias e de repente dei de cara com o Mario, falei pra ele assim: “Pqp Marião! Que legal ver você aqui” ele só mandou rindo alto: “Vim lhe buscar Cição, brother é brother, né? Ele não resistiu, bateu no topo da subida do Gran Cool Ferret e desceu a piramba comigo.
O tempo começou a fechar e pouco antes de chegar em La Fouly no km 109 começou uma chuva torrencial de granizo. Coloquei o anorak, usei tudo o que tinha naquele PC.
Alguns imprevistos
Seguindo rumo a Champex-Lac recebi a notícia de que meu running crew não chegariam neste PC, a chuva que havia caído deixou a equipe ilhada, a água que descia da montanha danificou a ponte da cidade e a previsão para o conserto era as 6h da manhã. Ainda era 19h da noite. Eu meio que engoli o choro e pensei:” Reprograma tudo que agora o negócio vai ficar mais difícil” Cheguei em Champex- Lac com 27h55m de prova, o corte era as 2h30 da madrugada e eu havia chegado as 22h30, estava bem. Só o frio atrapalhava minha tranquilidade, pensa num frio e agora multiplica por 3! Doía a alma! Os amigos que me viram passando pela câmera da prova depois me disseram: “Cição, ali eu fiquei preocupado contigo, você parecia um zumbi!”.
Para minha alegria, dei de cara com o Rodrigo João, ultramaratonista que mora no Rio e que me deu uma força naquele PC, pois só o fato de ouvir: “Cição, precisando de qualquer coisa avisa!” já é um super alento. Tratei de comer, me hidratar bem e seguir rumo a Trient encontrar meu time, mas antes disso, teria que enfrentar a subida para La Giete…
Subi a La Giete muito bem: estava forte, tinha recuperado as minhas forças. Ali vivi aquelas coisas loucas de quem faz corrida na montanha, precisei de um pit stop number 2! Hahahaha! Estrategicamente, escolhi um momento que estava sozinho na trilha, sai do curso, fui para um cantinho nos meios de algumas árvores, desliguei a headlamp e pensei: “Será que algum lazarento vai por luz em mim?”. Dito e feito! Não demorou muito e vi alguns atletas subindo e como num ato de marotagem jogaram suas luzes na minha bunda! Em gargalhadas, pensei: “Faz parte do jogo”. Recolhi o meu número 2 e levei num saquinho fornecido pela organização.
O PC em La Giete era numa casinha na montanha de teto baixo (sei disso porque dei duas cabeçadas no teto). Vi alguns atletas deitados meio que exaustos, era madrugada, tomei um “gorpinho” de café, reabasteci minhas garrafinhas e tratei de cair fora dali morro abaixo.
Ao chegar em Trient no km 140, me lembro do narrador falar meu nome e o ritmo de axé invadir o auto-falante, brinquei dizendo: “Brasil is here!”. Encontrei minha equipe, eles sempre faziam uma festa quando me viam. Meus pés queimavam, mas pelo menos o estômago estava em paz. Tratei de comer e me hidratar bem. Passei vaselina nos pés já doloridos e tratei de dar sequência na minha prova.
Cheguei em Vallorcine com 36 horas de prova, eram pouco mais de seis da manhã. Na minha cabeça eu achava que teria mais duas montanhas, foi quando meu brother Edinho me disse assim: “Truta só faltam 21kms, bora lá, uma montanha e você realiza seu sonho, vai devagar”. Quando ele me disse que era só uma montanha, me enchi de energia e dali segui firme rumo ao La Tête Aux Vents…
Meu relógio marcava 38h48m de prova quando atingi La Tête Aux Vents passava por uma trilha linda e única, que lugar abençoado! Em pouco menos de uma hora, chegaria ao penúltimo PC Laflégere e comecei a visualizar a chegada em Chamonix, as lágrimas transbordaram, junto com as orações de agradeciment.
Como um último ato dos deuses da montanha, aconteceu algo que até então nunca havia acontecido comigo, me distrai e perdi a entrada da trilha! Despenquei montanha abaixo, quando dei conta que não havia nenhum atleta e muito menos nenhuma marcação, pensei: “Putz, perdi a entrada da trilha, puta que o pariu”. Já muito cansado, tentei mais uma vez ver o copo cheio e pensei: “Você esperou tantos anos por esse momento, que os deuses querem que você fique mais um pouco na montanha” e comecei a rir de mim mesmo. Encontrei um casal jovem de franceses, vestido com roupas de ultramaratonistas, perguntei onde ficava a trilha correta, eles me mostraram onde eu havia errado. Resultado? Havia descido uns 2,5 kms morro a baixo e agora teria que subir. Eu ri, fazer o quê? Isto me custou uns 40 minutos pelo menos.
A chegada em Chamonix
Faltava bem pouco agora, uns 3,5 kms de morro a baixo e mais 1,5 km pelas ruas de Chamonix. Aqueles gritos de: “Bravo, Supér! Começaram a surgir com mais intensidade. Quando cheguei no asfalto e atravessei a passarela sobre a pista, dei de cara com o Elmo e com Edinho. Me entregaram a bandeira do nosso país, as lágrimas caíam e aquele filme especial de todos os treinos e horas de dedicação começaram a surgir na minha cabeça.
Passei devagarinho margeando o rio de Chamonix. Ahhh! Como eu sonhei com aquela sensação! Crianças esticando as suas mãos para me cumprimentar, adultos aplaudindo, uma euforia energizante. Nos últimos metros, avistei o pórtico da chegada ao som de aplausos e gritos dos amigos: “VAI CIÇÃO!”. A música que me recebia depois de mais de 170 kms era nada mais nada menos que Ave Maria de Schubert, imagina a adrenalina?!
Passei pelo pórtico balançando a bandeira do Brasil com todas as forças que me restavam. Ganhei abraços carregados de emoção, fiquei olhando pra igreja ainda sem me dar conta do que havia feito, beijava sem parar a minha pulseira, tentando tangibilizar o que havia feito. Era a maior prova da minha vida e uma das mais desejadas do mundo!
Quando entrei no corredor para receber “La Vest” (o colete de finisher), me debulhei em lágrimas outra vez. Encontrei com os meus amigos, abracei todos, agradeci profundamente cada um deles por me acompanhar naquela jornada. Muita gente no Brasil também me acompanhou, sem dúvida foi algo gigante que fará parte da minha história.
Se me perguntam se valeu? A minha resposta é: “Valeu cada passo, cada momento de introspecção e de dor.” Sabe por que? Ser reconhecido pelas minhas filhas como um papai herói é algo indescritível.
Amo esse esporte e peço a Deus que me dê saúde para sempre estar em condições de praticá-lo. Tenho como meta ser um Marco Olmo brasileiro, ultra maratonista italiano que corre até hoje tendo mais de 60 anos.
Obrigado pela paciência de ler até aqui.
Cição.
31/08/2019
10 anos de Montanha.
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