Cruce de Los Andes: minha primeira prova de montanha

Publicado em 6 de dezembro de 2013

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Minha primeira ultramaratona foi na edição de numero 8ª do Cruce de Los Andes, em 2009. Neste ano, o desafio começou na fria cidade de San Martin de Los Andes, na Argentina, com fim na cidade chilena Mamuil Malal (“no meio do nada” – rs). Meu parceiro André e eu, percorremos cerca de 100 k pela Patagônia. Com o passar dos anos essa prova tornou-se uma das mais famosas da América do Sul, o que me faz ter fortes sentimentos em relação a ela. Foi nessa prova que passei admirar ainda mais a natureza, e vi o quão pequeno somos e, ao mesmo tempo, o guerreiro que existe em cada um de nós.
Foi nesse Cruce, que cresci como atleta e aprendi a ter uma relação de sentimento especial com as montanhas: é um tipo de corrida que envolve respeito ao próximo e ao meio ambiente. É uma corrida que tem na sua essência, ensinar aos corredores de primeira viagem a vivenciarem uma série de sensações, nas quais você precisa estar maduro para enfrentar: percorrer uma ultradistância pela primeira vez, dormir em barraca, tomar banho gelado em rio, usar banheiro químico, etc. Cá entre nós, não é para qualquer um. Por outro lado, tudo isso faz parte de um ambiente, onde o contato com a natureza é diário e quando se está correndo pela montanha, você entra em um estágio único de contemplação ao que de mais belo existe. E te proporciona uma constante conversa consigo mesmo.
Em 2009, eu ainda cheguei a participar desta prova na versão “old school”. O que isso significava: a prova só existia na versão em dupla e eram no máximo 500 duplas, tínhamos que montar e desmontar a nossa barraca (minúscula diga-se de passagem), cada atleta só podíamos pegar 1 tipo de comida, optando por massa ou frango além de outras regrinhas.
O Columbia Cruce nasceu em 2002, a fim de unir à Argentina com o Chile, por 3 dias, através dos Andes. E já na sua primeira edição, reuniu 300 participantes que atravessaram a fronteira destes países sobre montanhas e maravilhosos senderos.
Cruce é uma corrida destinada a pessoas que querem iniciar nas provas de trilha. É um evento sob medida para pessoas que viajam nas montanhas por uma questão de renovação pessoal e espiritual. A prova valoriza o bem estar das pessoas e das paisagens muito mais do que tempos e registros (vale lembrar que os brasileiros são multicampeoes nessa prova, cito, como exemplo a Cris Carvalho).
Então, quando eu visitei pela primeira vez o Cruce em 2009, o desafio se tornou físico pelo fato de eu ter me machucado logo no primeiro dia e ter conseguido terminar a prova, como se acendesse uma chama e uma paixão de guerreiro dentro de mim. E junto disso, cresceu a humildade, além do respeito pela natureza. Respeito aquelas montanhas, humildade para ver atletas superando a minha performance e superando as próprias marcas, e garra para enfrentar as minhas dores e os meus medos durante aqueles 100 k.
Quatro anos se passaram e tive a oportunidade de fazer novamente essa prova, em 2011 e em 2012. Mas era um novo Cruce de Los Andes, com uma infraestrutura de dar inveja a qualquer maratona de rua do mundo: helicópteros, fotógrafos, drones, camping já montados, comida e bebida a vontade, barracas de atendimento médico de alto nível, e gora você pode até fazer o percurso na versão solo. Hoje, o Cruce possui inúmeros patrocinadores podendo atrair quase 3000 corredores de dezenas de países.
Temo apenas que o Cruce não cresca demais e não vire uma prova que atraia milhares de corredores que venham por modismo e não entendam a essência da corrida em trilha. Temo que o Cruce vire uma “loteria” no futuro, onde que os amantes da trilha tenham que lutar por uma vaga. Quero continuar tendo admiração pelo Cruce, quando vemos e torcemos para que os últimos finalistas cruzem felizes pelo pórtico de chegada com a garra estampada nos rostos. Esse é o espírito que faz corrida de montanha ser tão especial. E é o espírito para a qual devemos permanecer fiéis.

Grandes companheiros. Grandessíssimos esportistas.
Grandes companheiros. Grandessíssimos esportistas.
Acampamento do Cruce de Los Andes 2009.
Acampamento do Cruce de Los Andes 2009.
Amigos e eu após o Pórtico de chegada.
Amigos e eu após o Pórtico de chegada.

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