XTERRA Brazil Ilhabela: 50K do céu ao inferno e do inferno ao céu

Publicado em 9 de junho de 2014

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Dia 06 de junho chegou e faltava menos de 24 horas para mais um grande e lindo desafio. Saímos de São Paulo eu, Nãna, Rebecca e a Cris rumo a Ilha da Magia. Fizemos uma viagem tranquila, onde íamos falando da estratégia a ser usada, detalhes sobre o clima etc. Ao chegarmos, fomos direto buscar o kit e logo de cara tivemos um pequeno contratempo: o pessoal da organização, solicitava que fosse apresentado atestado médico. “Ihhhhh ferrou, comi bola na leitura do regulamento”. Fiquei bravo no começo, mas logo caiu a ficha de que os caras têm total razão em solicitar este documento.
Fomos orientados pela organização, eu e mais um monte de atletas que o hospital central de Ilha Bela estava fornecendo os atestados e lá fomos nós atrás deste documento. Confesso que num primeiro momento, achei esquisita aquela informação, mas era o que tínhamos para aquele momento. Chegando no hospital, fiquei esperando na fila e de cara me senti mal. Senti-me mal de estar num hospital cheio de saúde atrás de um atestado sendo qua haviam pessoas ali com necessidades muito mais sérias do que a minha. Não aguentei, saí dali e comecei a pensar numa outra solução, liguei para Dra. Regina que conhece o meu histórico de atleta e gentilmente me enviou um atestado por email e com isso no dia seguinte eu consegui retirar o kit da prova. Retiramos o kit logo cedo, assistimos o Moleta ganhar o triathlon, almoçamos algo leve e voltamos pro hotel.

REDS. Pronto para a diversão.
REDS. Pronto para a diversão.

Mudanças na prova e alguns contratempos | Cris, Thiago e eu estávamos a menos de 2 km da largada e com isso optamos por irmos aquecendo até o pórtico pouco antes da largada. Quase chegando, lembrei que tinha esquecido da minha “headband”, me senti estranho, confesso, pois estou acostumado a correr de bandana. Não obstante àquele contratempo, a Cris pergunta para o Thiago Mini Cooper se ele tinha pego o chip da prova e ele responde: “Putz! Esqueci essa p…”. O fera tinha esquecido de colocar o chip e voltou correndo para buscar, numa mistura de aflição, raiva e velocidade lá foi o Mini buscar o único item que não podia ser esquecido, faltavam pelo menos uns 12 minutos para ser dada a largada daria tempo suficiente para ele buscar. Chegamos na largada eu a Cris e demos de cara com alguns amigos, o Vascão “roots”  que sempre me pergunta “e ai Cição, qual será a estratégia da prova?” e eu, como sempre, respondo: “vamos nos divertir muito”. Encontrei também os atletas amigos da North Face, Upfit, Jvm entre outros, dava pra sentir a energia do lugar com a vibração dos familiares. E no meu caso em especial eu procurava a minha esposa e a minha filha Rebecca.
Não demorou muito a buzina tocou as 13h56, ao mesmo tempo que achei a minha família voltei até elas ganhei um beijo carinhoso de boa sorte. Larguei lá atrás e passei por último sob o pórtico, ainda curtindo a galera e a energia da largada, fiquei pensando com os meus botões: cadê o Mini Cooper? Bom, se conheço a fera já, já ele passará por mim.  Neste horário o calor estava dando o ar da graça, pensei comigo? Esse ano a prova será mais dura, pensei: paciência que tudo dará certo. Logo de cara a segunda mudança na prova em relação a última edição, uma pirambeira daquelas a famosa “subida do triathlon” foi de fazer as panturrilhas gritarem, o que servia de alento era o visual “surreal” que tínhamos de toda Ilha Bela, aquilo servia como energia para alma. Não demorou muito adivinha quem apareceu do meu lado? Suando mais que tampa de caçarola – rs – ele, o Mini Cooper, só deu tempo de dizer uma frase de apoio: “Mini está tudo certo, você já está aqui, a prova apenas começou, respira fundo e faça a sua prova leve!”. Ele olhou para mim, fez um sinal de positivo e partiu.
O primeiro pelotão era liderado pelos profissionais, o rei da montanha Virginio, Célio, Marcio Souza e o Mirailton e no final desta primeira subida acabei encostando no segundo pelotão que era liderado por ela, a Super Rosália. Já no primeiro single track demos de cara com uma trilha bem técnica que me fez lembrar do KTR Serra Fina, pois estava bem lisa, com aquele barro preto, além de ser bem técnica. Logo ali levei o meu primeiro tombo, sorri e foquei ainda mais onde estava pisando. Na descida tomei a liderança do pelotão por alguns minutos mas logo na subida dei passagem para os mais rápidos me passarem (Rosália, Mini Cooper, mais dois outros atletas). No 6 km minhas pernas estavam gritando, sentia um calor brutal e dali em diante pensei no que seria aquela prova, e mentalizava “calma que você terá que ir do céu ao inferno e do inferno aos céu muitas vezes ainda… keep calm e engole o choro”. O pelotão foi se dispersando com os dois atletas indo a frente, com a Rosália na bota e o Mini na bota da Rosália e um pouco mais atrás eu. Na subida em direção a praia de Castelhanos, via o Mini de longe mas não demorou muito fui ultrapassado por dois competidores, sendo um deles de origem francesa, um cara muito simpático e um brasileiro jovem que não aparentava ter mais de 30 anos. Os KMs foram passando, eu procurava ficar atento na hidratação e na alimentação.
Ao final, no 20km começara a descida. Soltei as pernas e voltei a avistar – e acabei passando – o Mini Cooper e logo quando adentramos o segundo single track perto do 23km dou de cara com a Rosália, perguntei se estava tudo bem, ela me fez um sinal de positivo, abriu e continuei a descer. Na metade do single track, alcancei o francês que tinha me passado na subida, gritei esquerda e ele gentilmente abriu, mas com ar de preocupado soltou a seguinte frase:

“perdi a minha lanterna, estou preocupado quando chegar o escuro” disse a ele que estavámos num ritmo parecido e que se continuássemos assim, poderia ajudá-lo quando a noite chegasse, desviei por um segundo os meus olhos da trilha para ajudar o francês, acabei tomando um “capote federal” com direito a rolamentos no melhor estilo “telecat”.

Mal sabia que o nosso amigo francês renderia mais uma história dali a alguns quilômetros (aguardem mais algumas linhas – rs). Chegando na praia de Castelhanos, tivemos mais uma mudança no percurso, passamos por um single track “lazarento de bonito” antes de chegar na praia, não sei ao certo qual era a extensão, mas a minha impressão é que tinham muitos KMs e que eram intermináveis. Ao vencermos este single track, entrei na praia acompanhado do Garoto, Mini Cooper e o Francês.
Posso descrever a você que está lendo este post, que a praia de Castelhanos é um lugar simplesmente mágico, parece que você ingressou num outro mundo, é como se estivéssemos passado por um portal, voltado no tempo, para milhões de anos no passado.

Abri os braços, chorei e agradeci a Deus por estar ali com saúde e curtindo aquela natureza exuberante.

Nós chegamos praticamente juntos no posto de controle da praia e não demorou muito para a Rosália também juntar-se a nós. O grande barato é que o staff era formado pela população ribeirinha, houve um grande frisson por parte deles quando viram que a primeira mulher: “chegou a primeira mulher, a primeira mulher chegou”, senti a vibração daquela energia e acredito que a Rosália também tenha sentido o mesmo. Um capitulo a parte, fiquei muito feliz e aprendi muito na forma como a Rosália conduz a sua corrida, sempre com uma expressão serena no olhar e com movimentos leves de pernas e braços. Ela parece flutuar, no seu corpo pequeno  vemos de fato uma grande guerreira.
Voltando a prova, ajudei o atleta jovem a fechar seu compartimento de água de sua camel back, finalizei a minha hidratação com um belo soft drink chamado coca-cola (essa eu aprendi com o Togumi, da Upfit – rs) e partimos de volta às trilhas. Lá estava eu liderando o pelotão, mas não demorou muito e fui ultrapassado por todos eles (o Jovem, o Frances Simpático, o Mini Cooper e a Rosália). A volta foi bem dura, essa turma começou abrir de mim, principalmente quando chegamos no single track. Tive um desconforto estomacal, tomei um sal de frutas e não demorou muito pensei com os meus botões “cá estou passando por mais um perrengue” mas se bem me conheço já, já a situação melhora, mas confesso que aquela trilha ladeira acima parecia interminável. Ao chegar na estrada comecei a subir e já no 33km sabia que até o topo tinham mais uns 5Ks  era só eu naquela estrada (e alguns morcegos que deram o ar da graça). Olhava meu relógio de minuto e minuto e parecia que não saía do lugar. Disse a mim mesmo: “para de olhar essa p…. e foca em colocar um passo na frente do outro, procurei fazer isso e as coisas deram uma leve melhorada rs.”
Parte Final: a descida | No começo da descida, aumentei o ritmo e a sensação que poderia ter câimbras na minha coxa esquerda era cada vez mais presente. Não sei se fiz certo, mas foi a solução que me veio a mente: comi batata fritas (sal a gosto – rs) ao mesmo tempo que jogava água gelada na minha perna… a dor cessou e aumentei ainda mais o ritmo. Prometi a mim mesmo que só olharia o relógio quando chegasse a cidade. Para a minha surpresa, passei alguns corredores, que acredito eram os guerreiros que estavam fazendo os 80K .
Desci que nem um louco focado, concentrado na qualidade das minhas passadas e movimento dos meus braços, não demorou muito, ao fazer uma curva me deparei com duas lanternas paradas, pensei comigo “vixi tem algo errado acontecendo ali. Quando chego perto para oferecer algum tipo de ajuda, dou de cara com o Mini Cooper “estatelado” no chão, recebendo um apoio do francês simpático. Pergunto o que houve e o francês me diz que ele acabara de virar o pé e o Mini diz: “Véiii, torci feio, tá doendo pra c… não vai dar , não vai dar”. Putz! Faltavam menos de 10k para terminar a prova, precisa fazer com que ele não desistisse: “Thiago, levanta do chão! Aguenta firme e segue trotando que já esta acabando, numa prova dessas temos momentos em que estamos no céu e momentos que estamos no inferno, pau no gato meu caro e foco no seu objetivo, seu corpo está quente, veja se consegue apoiar o pé e manda bala”. Ele na força de um guerreiro disse-me: “Véiiii fica tranquilo que irei terminar, vai lá faz a sua prova, na boa meu irmão, vai tranquilo que estou bem”. Segui em frente, tendo a partir dalí como companhia o Francês (que, detalhe, estava sem headlamp) e assim fomos assim até o km 48, quando chegamos na cidade disse a ele no meu francês fluente (rs): “ALLEZ ALLLEZ, Buddy”, pois já estava bem cansado daquela pancadaria que foi aquela descida.
Faltando menos de 2km, resgatei todas as forças que ainda me restavam e aos gritos de parabéns guerreiro vindo das pessoas na rua, fui as lágrimas, vibrei muito, gritei, pensei como foi difícil completar essa. Foi uma realização pra mim ter enfrentado esse desafio. Fiquei muito feliz com a minha posição, fui infomardo pela minha esposa que poucos haviam chegado até então e soube que tinha chegado em 10 na classificação geral (incluindo os profissionais, ao menos uns 5) e sendo o 1º na minha categoria. O francês chegou em 12º lugar, o Mini, de forma fantástica, terminou em 13º lugar no geral e em 4º na categoria. No feminino, a Rosália sagrou-se campeã, chegando há exato um minuto na minha frente com 5h46m e a Cris guerreira chegou em 5º no feminino. Ganhei mais do que uma medalha, ganhei abraços da minha família, ganhei novos amigos e fui banhado pela alegria e pelo carinho das pessoas que amam este esporte.
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Se você leu até aqui é porque no mínimo ficou curioso com a história do francês simpático, pois bem. Eu pensava com os meus botões como foi que o Mini virou o pé. Era uma estrada de terra batida, tinha buraco sim, mas com a luz da lanterna dava perfeitamente para se livrar dos buracos….Somente a noite pós-prova que descobri, quando pude ouvir da boca do Mini durante a nossa pizzada com vinho que, ao ajudar o francês simpático iluminando o caminho pra ele, assim como tinha acontecido comigo na ida, ele tirou o olho da trilha por um segundo e acabou pisando num buraco e virou o pé.
Filha de ‘pau no cat’, “pau no cat” é | No domingo fui brindado pela “good vibe” da minha filha que correu a provinha do XTERRA KIDS, queria por que queria correr de mochila igual ao papai, mas depois de muita conversa, ela deixou a mochila de lado e foi correr a sua bateria finalizando em primeiro lugar ao som do papai babão “Corre Rebecca. Vai Rebecca. Corre Filha!” rs.
Confira aqui a video reportagem do XTERRA ficou bem legal!!!
 
É isso galera #Paunocat e vamos para o próximo desafio!
Agradecimentos especiais:
Dra. Regina, por ter me salvo com atestado
Dr. Mauricio, ao gelo e as boas conversas
Dr. Liaw,  agulhadas e gargalhadas
A Nãna, por acreditar em mim e por ser a minha principal torcedora <3
Ao Gabriel, amigo que cuida desta máquina como ninguém
Ao Coach Sinoca, queridíssimo técnico por me ensinar todos os dias
Aos meus parceiros de corrida: Mini Cooper e a Cris “Ana Frost brasileira”

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